O Contexto e o Natal

Eu gosto de acreditar de que tudo tem que ser visto dentro de um contexto e que o mesmo fato pode ser interpretado de diversas maneiras de acordo com a perspectiva e a informação que você tem acesso. Dizem que o primeiro passo é o mais difícil, mas todas vez que eu comecei a fazer dieta a segunda-feira foi o dia mais fácil de todos. Todo mundo diz que é fácil falar e que todo mundo tem uma opinião sobre tudo, mas quando você o faz na internet, onde se está exposto ao ódio de outros, nem sempre é tão fácil ler os comentários negativos a respeito daquilo que você acredita. Muitos brasileiros diz que Natal deve ser celebrado em família, mas o que fazer quando a sua família está a 17.518,64 km de você?

Sim, é véspera de Natal, final de ano e todo mundo começa e refletir sobre o ano que passou.  Eu tenho tentado entender porque certas datas me fazem sentir mais saudade de casa do que outras, a minha conclusão é que as memórias associadas a uma data específica é que nos fazem querer reviver aquelas lembranças positivas. 

Passar o Natal longe da família não é um sentimento indiferente para mim, esse será o sexto ano que vou passar na China, mas nenhum ano é igual ao outro. Eu me lembro dos muitos Natais que passei em família. Das noites de véspera celebradas com a família do meu pai e o dia com a família da minha mãe. De esperar até a meia noite para comer, de jogar bingo e dominó e da sensação de celebrar a data de forma especial. 

Quando eu era um pouco mais velha, nos mudamos para cidades mais afastadas da maioria dos nossos familiares, nossos Natais eram celebrados entre minha mãe, meu pai, meu irmão e eu, e eles passaram a ser o significado de estar em família, nós quatro. 

Meu primeiro natal na China pode ser resumido a trabalho, tristeza e solidão. No sentido negativo que a frase pode ser entendida. Eu havia chegado em Outubro, estava me adaptando, e a solidão era algo que eu estava aprendendo a lidar, talvez o mais difícil era guardar isso para mim e não compartilhar com ninguém esses sentimentos, porque eu acreditava que contar isso a minha família só iria deixar tudo mais difícil, era algo que eu queria superar sozinha. Refletindo hoje, foi a melhor decisão, porque me fez amadurecer e conviver melhor comigo mesma.

Em Guiyang, meu primeiro Natal, segundo na China, foi um pouco mais interessante, além dos jantares e amigos ao lado, houve a descoberta de que Guiyang comemorava o Natal. As ruas estavam cheias, os bares não haviam poucas mesas vazias, guerra de spray de neve artificial e colorida nas praças do centro da cidade (não me perguntem o porquê, mas aqui quando eu cheguei, os chineses compravam neve artificial e colorida e esperavam dar meia noite parar jogar uns nos outros). Infelizmente essa tradição se perdeu e os chineses em Guiyang já não celebram como antigamente o Natal.  Com o André aqui, meus Natais foram mais próximos do convencional, havia família, meu irmão e meu cunhado também celebraram conosco por dois anos, tínhamos mais amigos.

Natal passado mais uma vez com amigos, cada um preparando um prato, a espera pela meia noite, comemoração, abraços,  amigo secreto, lembranças e uma casa cheia de espírito natalino. Uma das poucas coisas que a vida de expatriado, em uma comunidade tão diversa, é a experiência de compartilhar da cultura do outro de maneira especial. Eu celebrei Natais com ateus, ortodoxos, muçulmanos e judeus e em nenhum momento a nossa diferença religiosa nos afastou, pelo contrário. Eu me lembro do Natal que nós passamos na minha casa, uma amiga nos explicou um pouco melhor sobre o judaísmo, como eles celebravam e ela ainda nos presenteou nos ensinando uma das canções. São memórias preciosas como essa que fotos e vídeos jamais irão substituir e que eu dificilmente teria a oportunidade de vivenciar se estivesse no Brasil.

Eu me lembro de tantas vezes no período de Natal anunciar para todo mundo que que ninguém podia esquecer de que Natal era para comemorar o nascimento de Cristo e que era um momento de renovação da nossa fé. 

Hoje, tendo a oportunidade de conhecer e compartilhar o Natal com pessoas que não veem a data da mesma forma, eu sinto a necessidade de recontextualizar a data. Eu ainda vou celebrar o nascimento Jesus, mas Ele pregava o amor ao próximo e meus Natais serão sempre uma data para renovar o meu amor ao próximo, independente de fé, raça, gênero ou qualquer outro rótulo ou minoria que você queira ou faça parte.

Um Feliz Natal, com muito amor no coração e esperança em dias melhores.

Published by Tassia Kespers

Escritora, professora, tradutora, revisora, mãe e exploradora nas horas vagas.

2 thoughts on “O Contexto e o Natal

  1. Simplesmente fantástico seu texto e com a cereja do bolo no final a melhor definição que alguém pode identificar vou celebrar o nascimento Jesus, mas Ele pregava o amor ao próximo e meus Natais serão sempre uma data para renovar o meu amor ao próximo, independente de fé, raça, gênero ou qualquer outro rótulo ou minoria

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  2. Bom dia, Tassia. .. Boa noite aí pra vc… já quase Noite de Natal…Que dentro do possível seja bem comemorado,  principalmente em seu coração e nos seus princípios basilares…Feliz Natal… saúde e bênçãos a vc e família. Forte abraço do tio J.Jodas Enviado do meu Galaxy

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