É interessante observar que pouco importa o assunto, na maioria das vezes, a dificuldade é sempre a mesma, “encontrar o equilíbrio”. Esse texto não tem a intenção de sugerir que as pessoas sejam narcisistas, se apaixonem pela própria imagem e esqueçam completamente do mundo ao redor. Nem tão pouco que deixem de se sentirem bonitas e valorizem apenas a beleza interior. Esse texto tem o objetivo de relatar exemplos de identificação na minha busca em aceitar quem eu sou.
Eu me lembro que quando eu era mais nova eu admirava demais certas atrizes mais velhas pela beleza delas. Era algo que ia além dos traços finos, talvez fosse a postura e a atitude de quem se sente feliz ao olhar no espelho. Eu queria ser tão bonitas quanto elas, tão confiante quanto elas, mas não sabia bem o que fazer. O tempo passou e eu tive outras questões mais urgentes para focar e, sem dúvida alguma, a minha vaidade e self-care foram deixados de lado.
Recentemente, eu me permiti mergulhar no mundo das séries e filmes sem me preocupar com o dia de amanhã (sim, eu estava de férias). “Maratonei” todas as temporadas das séries que estavam à minha espera e fiz bom uso da coletânea gigantesca de DVDs que uma amiga me repassou. Entre o que eu assisti, um filme e uma série me transmitiram a mesma mensagem: “A importância do amor próprio”.

O filme “Boa sorte, Leo Grande” (disponível no Hulu) foge do enredo clichê de cliente que se apaixona pelo profissional do sexo. A cliente (Emma Thompson) uma mulher acima dos 60 anos, viúva e decidida a experimentar algo novo, contrata os serviços de Leo e no decorrer de quatro encontros o filme expõe inseguranças e preconceitos que toda mulher já sentiu em algum momento na vida.
Os diálogos foram minuciosamente construídos, Emma Thompson dá um show no papel de uma ex-professora de ensino religioso, acostumada a agradar aos outros e que decide reconciliar-se consigo mesma. Para quem sempre fez tudo pelos outros, permitir ouvir-se é muito mais difícil do que se imagina.
Uma das cenas que mais me marcaram no filme é quando a viúva está diante do espelho, no quarto do hotel onde os encontros acontecem, e finalmente consegue contemplar-se. Ver a própria imagem refletida no espelho para muitas pessoas é motivo de vergonha. É uma cena muito delicada, sem falas, mas que diz muito. Principalmente para quem sempre teve dificuldade em olhar-se no espelho.

Em um entrevista durante o Festival de Berlim, Emma Thompson ressaltou a importância dessa cena e de como muitas de nós temos a mesma dificuldade. Como é difícil encarar-se diante do espelho, porque tudo ao nosso redor nos relembra o quão imperfeita nós somos e como tudo está errado e precisa ser melhorado. Ela então desafia: “Tente ficar diante do espelho, não se mexa, não se esconda, não julgue e apenas aceite o que você vê”.
O filme foi claramente escrito para o público feminino, os tabus que o filme traz fazem parte do cotidiano de muitas mulheres, e que já passou da hora de serem discutidos abertamente na sociedade. É muito difícil não se identificar em nenhum momento do filme se você é da mesma geração que a minha ou anterior.
Nem um mês depois de ter assistido ao filme citado eu me deparei com a série Queer Eye Brasil (Netflix). Minha mãe foi quem me apresentou o programa ainda com a formação original. O foco do show é ajudar a/o participante a lembrar-se da importância de se cuidar com o mesmo carinho que ele/ela trata os outros. Normalmente, a pessoa escolhida foi indicada por um amigo ou familiar. Cada queer ou fabuloso (como foi traduzido no show) é responsável por contribuir de alguma forma na transformação do escolhido que ganha uma repaginada na casa, no armário, no visual e é motivado a adotar uma mudança de comportamento para que se sinta melhor.

Assistindo aos episódios brasileiros, nem todos os episódios são tão emocionantes e emblemáticos como no americano, mas para todos os participantes o momento de se colocar diante do espelho parece assustador. No primeiro dia eles mal se olham e é preciso que eles sejam convidados a admirarem o seu reflexo. Ao final da semana, com roupas novas, corte de cabelo e maquiagem, eles se lembram de que também merecem ser amados.
Tem gente que gosta de refletir sobre cada minuto do dia, eu acredito que seja chato e trabalhoso demais tentar encontrar uma lição ou positividade em tudo. No entanto, eu não posso negar que com a idade eu tenho preferido usar o meu tempo para refletir sobre a vida e o mundo ao meu redor, mesmo que meu filho revire os olhos porque eu estou levando a sério demais o que não deveria.
Ainda assim, nessas férias eu fui lembrada de que preciso me cuidar o mesmo tanto, ou um pouco mais, do que eu me dedico ao que está ao meu redor. Há algum tempo eu tenho me desafiado a ser uma versão melhor de mim mesma, tem sido um processo lento, mas eu consigo perceber algumas mudanças. Alguns dias eu tenho coragem de me olhar no espelho, nem todos os dias eu consigo aceitar o que vejo, mas na maioria das vezes eu não sou tão cruel comigo mesma.
Bom dia. Lindo e real, assim mesmo que sinto, tenho tentado usar um pouco deste tempo, agora que estou aposentada .
LikeLike
Precisamos todos arrumar tempo para nós mesmos!!!! Tão importante e faz tão bem. Mas tão difícil de começar.
LikeLike